
Albert Gradvohl – Economista e Conselheiro da Agência de Regulação, Fiscalização e Controle dos Serviços Públicos de Saneamento Ambiental de Fortaleza – ACFor
Refiro-me às 80 milhões de toneladas de lixo por ano que são aterradas ou irregularmente destinadas a lixões no Brasil. Considerando, que 33% são insumos estratégicos para a reciclagem é possível afirmar que o país deixa anualmente de reciclar 24,4 milhões de toneladas, faturar R$ 23,8 milhões a preço médio de resíduos e mais de R$ 95 milhões em produto para o consumo. Todo esse desperdício se traduz em um mísero 4% índice de reciclagem somado a um cenário desigual e desumano de 800 mil catadores que procuram sobreviver por meio da informalidade verde, motivo pelo qual a Lei nº 15.088/2025 alterou o artigo 49 da PNRS Lei nº 12.305/2010 proibindo a atual importação de resíduos e rejeitos no Brasil, principalmente, de papel, vidro e metal.
A busca por uma Política Nacional de Economia Circular fez o Senado aprovar o PL 1.874/22 que somado ao DECRETO Nº 12.082/24 que institui a Estratégia Nacional de Economia Circular, contraria qualquer medida que venha flexibilizar a importação de lixo no Brasil. Sim, essa prática de importar resíduos pós-consumo de outros países, como sucatas de ferro da África, pneus dos USA, papel e papelão do Chile foi até então adotada no Brasil, motivo que impediu o desenvolvimento sustentável da economia brasileira em troca do tradicional modelo econômico oligopolista linear até hoje existente, insustentável e inadmissível. Enquanto abarrotamos de lixo nossas cidades, segundo a Global Market Insights Inc., a circularidade do mercado de embalagens verdes, intituladas “recicladas e reutilizáveis” deve ultrapassar 214,3 bilhões de dólares até 2032. Afirma ainda, que o setor de alimentos e bebidas vem crescendo, com uma taxa anual composta (CAGR) superior a 6% entre 2024 e 2032.
Portanto, mesmo com a alegação do Governo Norte-Americano de que o Acordo de Paris prejudica a economia dos USA em detrimento do crescimento de outros países, o fato é que a conscientização global sobre as questões ambientais vem a cada dia evoluindo e se consolidando economicamente. Por outro lado, as mudanças regulatórias e as inovações tecnológicas, a exemplo do Regulamento da União Europeia sobre resíduos de embalagens pós-consumo, já não mais é uma tendência. Segundo pesquisa da McKinsey & Compay, 51% dos consumidores pesquisados procuram produtos e embalagens ambientalmente adequadas, mesmo considerando a importância de outros atributos, como segurança, conservação do produto, higiene, maior “shelf life”, durabilidade e facilidade no uso. Considerando as embalagens como sendo um dos principais resíduos de produtos industrializados, e contrariando o atual conceito das embalagens tipos “descartáveis recicláveis” conhecidas no mercado brasileiro como “one way”, a tendência a partir deste ano 2025 é que o mercado mundial demande embalagens descartáveis, porém do tipo “reutilizáveis recicláveis“. Reporto-me àquelas que induzem instintivamente qualquer pessoa em não às descartar imediatamente no lixo, como: a lata de biscoito, o copo vidro do requeijão e o pote plástico de sorvete. Normalmente, são reusadas noutros fins, e com o tempo vão para o processo de reciclagem.
Com o encerramento em 02 de agosto de 2024 para o fim dos lixões a reciclagem de resíduos sólidos passa a ser de fato uma grande oportunidade, a depender de políticas públicas que subsidiem custos de logística reversa, como coleta, transporte e segregação de diferentes fontes geradoras, assim como, o uso de resíduos nos processos produtivos, permitindo negócios inovadores ao longo da cadeia de valor, crescimento do nível de emprego e renda, redução das desigualdades sociais, e estímulo para novos investimentos.
Apesar de relevante, os discursos e campanhas institucionais em relação ao descarte irregular do lixo nas cidades brasileiras procuram apontar como principal causa a falta de educação da população. No entanto, a geração de lixo é função direta da renda e do consumo. Certamente, a inexistência de incentivos que propiciem investimentos focados na logística reversa é o principal motivo desse desperdício de matéria-prima em lixões. Aterro com extração de biogás para produção “biometano” em escala, indústria de celulose e papel a partir do bagaço de cana originado das usinas de açúcar e álcool, são oportunidades de negócios sustentáveis existentes no Brasil estendendo o tratamento de seus resíduos sólidos.
Puxado como um vagão, o Brasil já ensaia compromissos pela Gestão Integrada de Resíduos Sólidos de seus municípios. No caso, a Lei 12.305/10 que trata da PNRS, a lei 14.026/20 do NMSB, a Lei 14.260/21 de Incentivo a Reciclagem e o Decreto 12.082/24, que institui a Estratégia Nacional de Economia Circular são políticas públicas que apontam mudanças para o destino do lixo urbano, a começar pelo fim dos lixões. Esse desafio, só dependente da dinâmica do modelo econômico, cuja organicidade exige compromissos público.
Bibliografia:
ABREMA https://www.abrema.org.br/2024/08/29/logistica-e-valor-sao-principais-desafios-para-reciclagem-de-vidro-decolar-no-brasil/
GRADVOHL. Albert Brasil. Gestão Fortaleza. 15 anos a procura da coleta seletiva de lixo, Fortaleza: Prograph,2010.
Abrelpe. Panorama dos Resíduos Sólidos no Brasil. São Paulo. Abrelpe 2022