
Ricardo Aquino Coimbra, Conselheiro Corecon/Ce, Conselheiro Apimec Brasil, Membro da Academia Cearense de Economia, Mestre em Economia UFC/Caen, Professor UNIFOR, Professor UECE
A moradia é, sem dúvida, um dos pilares essenciais da dignidade humana e do desenvolvimento socioeconômico. No Brasil, onde o déficit habitacional ainda afeta milhões de pessoas, políticas públicas voltadas à habitação popular não apenas preenchem uma lacuna histórica de acesso à moradia, mas também dinamizam setores estratégicos da economia.
O setor da construção civil vive um momento de otimismo no Ceará, apresentando um cenário de crescimento, embora com algumas nuances. Há um aumento significativo nas vendas e na produção, impulsionado por programas habitacionais e investimentos em infraestrutura. No entanto, a elevação das taxas de juros pode afetar a demanda e o ritmo de crescimento. Programas como o federal Minha Casa, Minha Vida (MCMV) e o estadual Entrada Moradia Ceará têm sido fundamentais para estimular as vendas de imóveis e facilitar o acesso de milhares de famílias à casa própria. Entre janeiro de 2024 e maio de 2025, os dados apontam um crescimento expressivo nas vendas e na movimentação econômica do setor.
A construção civil é historicamente um dos setores com maior capacidade de geração de empregos diretos e indiretos. Além disso, possui uma forte correlação com o desempenho da economia como um todo. Segundo o Sindicato da Indústria da Construção Civil do Ceará (Sinduscon-CE), a Região Metropolitana de Fortaleza registrou um crescimento de 20% nas vendas de imóveis no primeiro bimestre de 2025 em comparação com o mesmo período de 2024, com 3.894 unidades comercializadas. O Valor Geral de Vendas (VGV) saltou de R$ 5,2 bilhões em 2023 para R$ 6,5 bilhões em 2024, revelando o impacto positivo dos subsídios e das políticas de estímulo à habitação. O gráfico a seguir demonstra esse avanço.

Fonte: Sinduscon-CE. Elaboração própria. 2025.
Esse avanço não é fortuito. A recuperação e expansão dos programas habitacionais foram decisivas para esse cenário. O programa Entrada Moradia Ceará, lançado pelo Governo do Estado, concedeu subsídios de até R$ 20 mil para famílias de baixa renda utilizarem na entrada do financiamento de seus primeiros imóveis. A iniciativa já beneficiou mais de 5 mil famílias e passou por ajustes para se alinhar às faixas de renda do Minha Casa, Minha Vida. O impacto dessa política vai além do número absoluto: ela destrava o acesso ao crédito e, com isso, movimenta o setor privado, gera empregos, aumenta arrecadação e contribui para a redução do déficit habitacional e ampliando o alcance da política habitacional. Como mostra o gráfico a seguir.

Fonte: Governo do Estado do Ceará. Elaboração própria. 2025.
Esses incentivos facilitaram a realização do sonho da casa própria para milhares de cearenses e aqueceram a economia local. O crescimento nas vendas também gerou novos postos de trabalho e impulsionou toda a cadeia produtiva da construção civil. Contudo, não se trata, no entanto, apenas de números. A importância de programas habitacionais deve ser medida também pela transformação que eles proporcionam na vida das pessoas. Moradia é mais do que um teto. É segurança, é endereço para conseguir um emprego, é proximidade com escola e postos de saúde. A habitação formal leva infraestrutura urbana, promove cidadania e combate a desigualdade. Nos bairros beneficiados pelos programas, observam-se melhorias na qualidade de vida, valorização imobiliária, maior inserção social e novos investimentos.
Sob esse ponto de vista, o Estado cumpre uma função que o mercado, por si só, não é capaz de realizar. O acesso à moradia, nos moldes de mercado tradicional, é restrito por barreiras financeiras, burocráticas e de risco de crédito. Os programas de fomento atuam como pontes, viabilizando o acesso de populações de baixa renda ao mercado formal e garantindo um direito constitucional fundamental. O papel do Estado é, portanto, não só legítimo, mas indispensável.
É importante destacar que a coordenação entre políticas federais e estaduais foi crucial para o êxito dos programas. A compatibilização entre faixas de renda do MCMV e do Entrada Moradia possibilitou maior alcance e evitou sobreposições ineficientes. Isso mostra que, quando há planejamento e articulação institucional, políticas públicas são capazes de transformar realidades de forma estruturada e sustentável.
Entretanto, mesmo diante desses avanços, não se pode ignorar os desafios. A sustentabilidade financeira dos subsídios, a qualidade dos imóveis entregues, a localização dos empreendimentos e a integração com transporte, saúde, educação e saneamento básico são aspectos que ainda precisam de atenção. A habitação popular não pode ser sinônimo de periferização ou guetificação. É necessário avançar em modelos urbanos mais inclusivos e inteligentes.
Além disso, o estímulo à inovação na construção civil — como o uso de tecnologias mais sustentáveis, industrialização de processos e novos materiais — deve ser incorporado às políticas habitacionais. Isso não apenas reduz custos e prazos, como também aumenta a qualidade dos empreendimentos e reduz impactos ambientais.
Também é necessário fortalecer o controle social e a transparência na gestão dos programas. A participação da sociedade civil, dos conselhos de habitação e das comunidades envolvidas é fundamental para garantir que os programas atendam às reais necessidades da população e evitem desvios de finalidade.
Portanto, programas como o Minha Casa, Minha Vida e o Entrada Moradia Ceará não são apenas políticas públicas: são instrumentos de justiça social, motores de desenvolvimento urbano e vetores de crescimento econômico. Eles mostram que o Estado, quando age com responsabilidade, planejamento e sensibilidade social, é capaz de induzir transformações significativas e duradouras.
O cenário para 2025 permanece positivo com projeção do Sinduscon Ceará de alcançar um VGV (Valor Geral de Vendas) de pelo menos R$ 5 bilhões, indicando um ano promissor para o setor. Com os ajustes recentes nas faixas de renda e o aumento do número de beneficiados, espera-se que os programas continuem sendo ferramentas estratégicas tanto para o desenvolvimento econômico quanto para a garantia do direito à moradia.
A construção civil, mais do que nunca, se firma como vetor de crescimento e inclusão, especialmente quando apoiada por políticas públicas bem estruturadas. E o que se espera, a partir da experiência cearense, é que essas iniciativas se ampliem e se aprofundem, consolidando um novo paradigma de política habitacional no Brasil — mais inclusivo, eficiente, transparente e comprometido com o futuro das cidades e das pessoas que nelas vivem. Moradia digna não pode ser exceção: precisa ser regra, política de Estado, compromisso permanente.
Referências bibliográficas
DIÁRIO DO NORDESTE. Mercado da construção civil deve crescer no Ceará em 2025. Disponível em: https://diariodonordeste.verdesmares.com.br/negocios/mercado-da-construcao-civil-deve-crescer-no-ceara-em-2025-avalia-cinduscon-1.3606899 Acesso em: 01 jun. 2025.
DIÁRIO DO NORDESTE. Perspectivas para 2025: Otimismo na construção civil cearense. Disponível em: https://diariodonordeste.verdesmares.com.br/opiniao/colaboradores/perspectivas-para-2025-otimismo-na-construcao-civil-cearense-1.3606539. Acesso em: 01 jun. 2025.
PORTAL IN. Mercado da construção civil cresce 20% na Região Metropolitana de Fortaleza em 2025. Disponível em: https://www.portalin.com.br/negocios/mercado-da-construcao-civil-cresce-20-na-regiao-metropolitana-de-fortaleza-em-2025/ . Acesso em: 01 jun. 2025.
GOVERNO DO CEARÁ. Entrada Moradia Ceará beneficiará 10 mil famílias. Disponível em: https://www.casacivil.ce.gov.br/2024/06/04/entrada-moradia-ceara-10-mil-familias-serao-beneficiadas-com-subsidio-de-r-20-mil-para-financiamento-do-primeiro-imovel/. Acesso em: 01 jun. 2025.
GOVERNO DO CEARÁ. Entrada Moradia Ceará chega a 5 mil famílias. Disponível em: https://www.ceara.gov.br/2025/05/13/entrada-moradia-ceara-chega-a-5-mil-familias-contempladas-e-atualiza-faixas-de-renda-para-se-adequar-ao-minha-casa-minha-vida/. Acesso em: 01 jun. 2025.